2.5.11

Die Walküre at the Met - III - "A máquina"



O comentário que o leitor Bosc d'Anjou aqui deixou,  e que muito agradeço, sugeriu-me algumas considerações em relação ao tema "encenadores".
Já li muitas críticas (e comentários em blogues) à nova produção d'A Valquíria. Algumas são positivas, outras antes pelo contrário. Como não a vi (e não poderei assistir à transmissão na Gulbenkian), pouco posso falar. Ouvi a récita de estreia em directo e fiquei muito bem impressionado com Jonas Kaufmann; Eva-Maria Westbroek estava doente mas creio que já estará bem e que será uma óptima Sieglinde, a avaliar pelo que conheço dela; Bryn Terfel deixou-me com emoções diversas; de Deborah Voigt não gostei; Stephanie Blythe e Hans-Peter König cumpriram muito bem. Note-se que me refiro a uma transmissão via rádio.
O problema das encenações modernas em geral, e desta em particular, é que muitas vezes não respeitam o libreto, a música e os cantores. O papel dos encenadores é fundamental, a menos que se assista a uma ópera em versão de concerto (que muitas vezes prefiro), para que dramaturgicamente tudo faça sentido. O cenário pode até estar vazio, desde que o encenador saiba como há-de trabalhar com os cantores de modo a que eles representem cenicamente os papéis que estão a cantar. Obrigá-los a desempenhar actividades circenses, como Padrissa fez em Valência, colocando o pobre Siegfried a cantar de pernas para o ar, parece-me pouco apropriado. Não acredito que um cantor se sinta confortável nessa posição. É aí que entra o bom senso, e por isso continuo a preferir sempre Patrice Chéreau, que valoriza acima de tudo o libreto e a música (ver o Anel de Bayreuth e o Tristão do Scala) e não os efeitos visuais de alta tecnologia, que são isso mesmo: efeitos visuais.
Assisti à transmissão d'O Ouro do Reno, que inaugurou a temporada Met Opera Live in HD na Gulbenkian, e apesar do impacto causado por algumas habilidades da máquina (as Filhas do Reno, a Descida a Nibelheim), decepcionou-me a falta de imaginação no aspecto dramático. Na maior parte dos casos, os cantores foram abandonados a cantar à frente do engenho, que pouco mais fazia que decorar o palco, e pareciam não saber muito bem o que fazer uns com os outros. Creio que se valorizou a cenografia em detrimento da encenação.
Talvez algumas coisas tenham mudado n'A Valquíria e na sala do Met o efeito é certamente diferente do que se vê no grande ecrã. Contudo, a minha dúvida sobre se terá valido a pena o investimento na máquina mantém-se. Consta que a máquina é ruidosa, que nem sempre funciona, numa das récitas uma valquíria caiu do cavalo, noutra foi o trono de Fricka que deu problemas e, na cena final, quando Wotan adormece Brünnhilde com um beijo e a rodeia de fogo mágico, uma das cenas mais belas da tetralogia, é uma figurante que surge disposta com a cabeça para baixo, deitada no topo da montanha (a máquina) envolta em chamas. O efeito visual não quebrará o encanto, sendo óbvio para o público que não foi de facto Bryn Terfel que deitou Deborah Voigt naquela posição? É uma pergunta que deixo a quem já viu A Valquíria.
Cavalgada das Valquírias (mais imagens)